Dizia-se mil coisas
Das magnitudes dos vitrais da igreja
Do tempo de ensaio do coro das crianças
Da organização que estava precavida com até o plano D
Disseram dos mil reais...
tão realmente certo, tão realmente exato, tão realmente comprável
a soberbia se fazia estar até mesmo com os mais raspados, com os mais danados
Também houve quem não disse nada, pois gostava de alegria
alegrou-se e foi o suficiente.
Mas um cabisbaixo, que nada sabia sobre medições ou generalizações,
contou a todos que pôde, sem pudor de retórica ou armação nas idéias,
em uma tentativa de se fazer usufruir pelos outros,
através de palavras que, segundo ele, nada poderiam significar perto do fato em si
Dizia ele que lá havia maçãs,
que não em reais mas em Realidade
eram lembranças sobre a carne úmida, carne-fruta do pecado
As cerejas, que deliciaram os convidados, mas somente por terem o formato dos corações
em um vermelho-escarlate-escorrido sanguíneo, cardíaco, do amor
Os pêssegos, pêssegos lisos que se mostravam como a pele lisa,
juventude lisa, idade de pele de pêssego, leve, fina
Dizia também ele das uvas que nos levavam à margem dos rios
em tempos helênicos, olímpicos
fazendo, a todos que conseguiam ver, lembrar da mão que doa, sem receber, uvas a boca de outrem,
cachos que pendem das falanges do recosto ao lábio alheio
lábio deitado, deleitado, reconfortado, recostado
ambos em prazer, mão e boca, em doação e recepção, carinho e carente.
E para mim, que tudo parecia inexato, esfumaçado,
com a ajuda que a memória nos permite desmodificar objetos,
colorir tudo oque é incolor, perfumar ambientes inócuos
eu também fazia modificar, iluminar, diminuir, tornar realidade.
Qualquer que fosse o devaneio desta minha cabeça safa de grandezas
conseguia transformar-se em lágrimas nos olhos,
e me refletiam de volta um mundo já criado por mim
Via, nesta condição, uma pequena bárbara
com um sorriso tão grande,
mesmo maior do que a própria pequena meio árabe parecia poder carregar,
e a colocava no lugar daquela pompa, tão própria dos pomposos
via carteiras e gizes no lugar das árvores e dos doces
séries a frente e a trás no lugar das famílias e seus lugares a mesa
professores e atazanações no lugar da música e seus tocadores
mas as badaladas daqueles sinos começaram a se distanciar,
e fazer lembranças tão firmes e convictas
se desfazer....
diluir....
liquescer....
escorrer pelos vitrais que carrego em meu rosto, em minha memória,
longe dos da igreja
desmascarando um passado de uma menina mais sorridente do que o seu tamanho permitia,
me perdendo de um passado que, enquanto derretia, tentava eu,
com todas as minhas forças, mantê-lo na memória
na tentativa medrosa de não perdê-lo, não escapá-lo, não esquece-lo
mas o presente me brilhou
mais forte do que o passado poderia aguentar sem morrer
e o lodo sujo do que já foi, limpando-se ía
abrindo-me um mundo novo todo que exatamente
naquele momento se apresentava,
através da janela clara que a lembrança limpa pode trazer
longe de qualquer modificação que me permitia a memória,
o brilho que eu temia se perder
foi substituído por um muito mais alvo, muito mais vivo, em suas próprias chamas
tão REAL, tão luz, tão sorriso, tão naquele momento
que nada mais poderia eu ver naquele lugar
a não ser um passado sorridente que se deixou substituir por um presente
duplamente iluminado, sorrindo em dobro, em dois, por completo,
B
agora B&B