Wednesday, October 29, 2008

Vulnerabilidade, mais uma mulher


E eis que mais uma se apresentou como entidade feminina.
Ela, que se mostra como sedutora, disfarçada de canto de sereia,
não diz quem é, mas sempre me convida para o fundo do mar

Nunca sei dos seus perigos, e desavisado vou atrás de seus sons
A medida que me afundo no mar, a respiração, enquanto boa, não me alerta de nada

mas chega o momento em que a falta de ar grita mais do que o prazer de sua música
e afogadamente corro pra superfície atrás da minha vida

até hoje, mais por sorte do que acaso, não morri afogado, mas já a vi, e vou contar-lhes como é, para que, se um dia a veres também e não perceberes que está no fundo do mar, acorde atentamente e corra para se salvar.


É velha, pele murcha pelo excesso de água, rosto arroxado pela falta de ar.
Os cabelos são sebosos, mesmo eternamente em banho

Sorriso, não possui, mesmo quando sabe que está para concluir o seu trabalho de matança
seu desejo é infinito, nunca há de se saciar

os olhos são negros por completo e não há brilho algum,
só fita o chão
talvez esperando que brote alguma satisfação das almas que já enterrou

tem poucas roupas, só farrapos dos fiapos
mas seu corpo também não se mostra

é o disfarce de tudo, e por mais que você acredite no que ve, quando a enxerga,
como já me aconteceu

deve ser tudo mentira

por que a senhora Vulnerabilidade tem justamente essa característica

a do sofrimento, sem nunca se mostrar como é

Tuesday, October 14, 2008


A brisa branca veio me buscar pela janela.

calma, silenciosa, pairando sobre a rua inteira chegou no 13°andar.

Todos da quadra que olhassem pela janela poderiam se sentir convidados por ela,

mas acho que poucos olharam, pois não encontrei quase ninguém quando vim pra cá...

Me agarrei na beirada da névoa que adentrava o apartamento,

e em um segundo já mergulhava nas nuvens.

Daqui, vejo alguns que dançam a unidade

outros que choram a diferença

mas toda semelhança há entre uns e outros

já que pouco dá para se distinguir de onde estou.

Ve-se e sente-se claramente só a grande névoa

que encobre as cabeças e faz tudo parecer um só

como quando só há música em meus ouvidos e nada mais,

ficando tudo permeado do mesmo.

E eu aqui, no meio do fofo, do branco

aproveito o quanto posso

para saber que das Mulheres, essas com letra maiúscula

A Criação, a Destruição, a Tolerância, a Exuberância, a Aceitação

podem me dar carona quando a neblina chega na janela...

só é preciso reconhecer

e chegar um pouco mais perto

Friday, October 10, 2008


Tenho um pedaço de carne crua em meus dentes,
abro-a como uma criança os seus novos brinquedos,
e me recompenso com o sangue espirrando fundo em minha garganta

as fibras frias rompem-se em um sulco calado,
pois nada sobra para elas que estilhar e chorar silenciosamente suas lágrimas vermelhas

sou a morte instalada em corpo benzido pela proteção,
me alimento de tudo e nada me consome,
faço a carnificina e não conheço o que me detém

a palidez da minha pele é banhada pelo sangue da podridão
e sorrio apreciando o poder que me foi concedido

minhas pernas dobradas, que me prendem rentem ao chão,
firmam-se cada vez mais,
meus dedos, com suas unhas agudas e fortes, retraem-se, ferindo a minha própria palma da mão

uso-as para espalhar a vermelhidão do sangue pelo meu pescoço
e minhas presas afiadas, impunes e punitivas
se mostram e brilham no meio de uma risada destinada aos céus

céus que me permitem todo estrago e nada me fazem

sou monstro embelezado pela falta de vida,
e, mesmo todo estragado, emputrefado,
não me resguardo e nada me diz que devo ser diferente

nos encontraremos um dia desses,
pela rua, elevador, corredores
mas não verás minhas manchas de sangue,
ou o meu dente afiado da morte

eu seguirei sem que nada me aconteça
mas você, que não desconfia,
deve se machucar com as cicatrizes que nasci para fazer

minhas unhas continuarão espalhando o sangue pelo meu corpo,
sangue limpo, que me beatifica, unge e me enche de cor

dos que acreditam e supõe a inocência

Friday, October 03, 2008

Do Amor


Pretenção falar sobre isso, né? é, eu sei. Amor...

Mas ao passo que a personalidade se desenvolve, o amor provavelmente deve surgir. Estamos todos aqui em busca de prazer, e, dos prazeres, não tem nenhum melhor do que poder amar. Veja que falo sobre poder amar, e não ser amado.
Ser amado é o que sobra para os que estão cheios de faltas e carências, o poder amar só é possível para os que estão na outra ponta, para os que estão prontos para se tornarem maiores do que são.

Morei em um castelo de gelo durante alguns anos, e eu, como seu soberano e soberana (princesa do gelo), permanecia protegido somente enquanto o frio existisse, sem ele, os tronos, baluartes, pilastras e torres, todos, desmanchar-se-iam.

Pois eis que lutei com todas as forças para que o gelo não me deixasse, e assim, segurei o máximo que podia para que aquela morada gelada não se esvaisse em águas mornas.

Hoje, neste dia, me dei conta de aprender a derreter!!

E, solto como pluma leve, flutuante, deixo que o tempo faça a temperatura que quiser!

Voltei a aprender a amar!!

Não foi difícil, meu ser tem inclinação, tem tendência natural ao amor (o seu ser também?)

E agora, deito em prazer!

Se o amor tem objeto, foco, ele se limita, se ofusca, se contrai, não é mais amor...

O amor que conheço é todo pleno da liberdade, emancipado como o ar, que envolve a tudo e a todos,
pura essência da natureza, em ondas enormes e gigantes, todas cheias de pétalas e delícias, estonteadas de emancipação e maturidade,
os olhos cheios de lágrimas, por transbordar a plenitude que se abre a todos os instantes,
são incapazes de enxergarem bobices e permanências.
O amor é a constância da impermanência.

E assim, amo a cada pequeno gesto o próprio gesto, sem mais seus objetivos,

dos feitos, é me cheio de contemplação ele em si, sem mais seus resultados,

balançado pelas delicadezas, posso dispender-me e gastar-me até que o último pedaço de gelo vire água, transando com todas as criaturas, sentidos, coisas e razões.

O amor sem destino, foco, objeto, é todo maior! Como uma paisagem onde você não aprecia aquela nuvem ali à esquerda, ou aquele pedaço de montanha mais no final do morro, mas pode aproveitar de tudo quanto o olho abrange. Amar é poder ser livre das idiossincrasias, não ter mais amigos ou inimigos.

Agradeço as águas mornas que passam por aqui, que, sem querer, me libertaram da prisão e do medo de perder minhas colunas de gelo.

Sigo, agora posso, amando cada pequena criatura e ato, mesmo os mais odiosos, para viver em êxtase e, sem nem o precisar querer, extasiar quem me acompanha

beijos carinhosos

Henri S.

Thursday, October 02, 2008

Macacos


Agradeço o Mario que, de tanto juntar bugigangas, guardou mais esta aqui.
Letra de uma música de 2003

Macaco
(Henri Siro Evrard)

Macacos que dançam, que cantam e que falam
Envergonham-se sem as suas roupas e sofrem pelos seus carros
Macacos que há muito tempo trocaram o mato pelo trabalho
Construiram as suas ruas e as invadem com seus contratos
Alguns macacos de fé e outros de cálculos exatos
Mas todos eles sofrem se se aterem a este fato

Macacos que mentem para não serem enganados
Macacos que destratam por se sentirem no destrato
Macacos que brigam com aqueles que lutam
Encontram o poder por poder proporcionar muitos lutos
Macacos que engordam e outros que ainda têm fome
Macacos que acham que já são homens

Macacos homens, homens macacos