Naquele dia houve um feito esplêndido. Fez-se matéria o que, há tempos, repousava somente em campo etéreo, e foi entregue aos olhos e sentidos humanos o que até então só poderia ser encontrado em sensação áurea e espectral.
Era fim de tarde e o sol que já fraco contornava as bordas do horizonte não justificava aquele amarelidão ouro que, paulatinamente, se apoderou brutalmente da cor verde do oceano. Os que olhavam a cena se desesperaram. Falaram do fim dos tempos, da nova era dourada e da chegada de um sol que nasceria das profundezas do mar.
Os mais corajosos que quiseram comprovar que o amarelidão seriam os raios desse novo sol, encostaram na água a mão esperando queimá-la com o calor, mas tudo que conseguiram foi dar risada no momento em que levaram os dedos à língua e sentiram o doce, comprovando no gosto aquilo que, ao toque, parecia mel.
O espanto geral não foi motivo para os eventos pararem de seguir seu rumo.
Daquele imenso oceano dourado começou a se soltar uma neblina calma e silenciosa, uma majestosa névoa de vapor adocicado que exalava o mar de mel.
E depois de todo o mar coberto por aquela rala e homogênea neblina, ela começou sua dança.
A fumaça mais distante chegava do fundo do horizonte para cima da areia na sequência de um instante, e a bruma que sobreava o raso das águas subia em contornos, por vezes se aglutinando, por vezes se distanciando, contorcendo-se ordenamente, esculpindo-se através dos sopros de seus movimentos, se quedando como um mármore celestial, fazendo nascer um objeto que começava na altura do mar e se extendia até o céu.
E enquanto a névoa era esculpida através de sua dança em direção ao firmamento, o mar de mel amarelava com ainda mais força e, apesar de não ter trazido à superfície nenhum novo sol, brilhava como se houvesse luz própria, fazendo de suas correntes e correntezas um palco pra aquela obra de fumaças.
As pessoas que admiravam aquele talhar de nuvens e não saíram correndo pelo medo, choraram de emoção quando entenderam que a arte completara-se, e do mais alto deste monumento caíam cabelos compridos sobre ombros e braços esguios, seguidos de seios bem formados, uma cintura curvada e sinuosa e coxas femininas bem arredondadas.
O salgado do mar se transformou em mel, o oceano imitou o sol, e o impalpável da beleza ganhou vida em uma escultura feita diretamente pelas mãos de Deus, testemunhada unanimamente de que aquele festejar de névoas e vapor se definia e personificava com conteúdo e sabor no que deveria ser o único formato conhecido pelos olhos e sentidos humanos capaz de caber tamanha sutileza, dança, doçura e sensibilidade: uma mulher.
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