Eu descobri que não estou pronto para a meditação.
A dureza da qual almejo me libertar
vedou a minha alma, preenchendo de matéria o que era vão.
O círculo vermelho proibindo meu térreo desapegar
não possui tanta força perto do que esteia meu coração
Que gostaria de estar se nutrindo de luzes no ar
Mas que é alimentado por raízes bem cravadas no chão
O corpo que reflete esse pôr do sol rosa pelos meus olhos nus
é livre de qualquer pretenção de procurar no céu outra existência ou raça,
também de descobrir qual o sentido da vida perdida de um homem pregado na cruz,
ele só se interessa por decantar nesta terra de barbáries, as belezas que nos aliviam com graça
E que a todo o momento vem quebrar em nosso rosto uma taça
Transbordando um líquido que se faz de matéria e não de luz
E o mar que se queda pintado com diamantes pela mesma solar luz divina
Só é deus, pra mim, porque está aqui pra eu pegar com a mão
e por que não são nada mais do que uma linha fina
que desenham uma amostra do que essas coisas terrenas são
E se é a luz do luar que atinge um lago sem a distorção da alma,
minha boca já ficha cheia de uma cascata inebriante,
e se vejo pintado um desenho impressionista prata sobre essa água calma
nenhum argumento me convence de que é uma ilusão intoxicante,
pois é dessa sólida bebida que prende meu corpo e alma na rede
concreta desse mundo que balança e sacia, do meu espírito, a sede
E se longe do belo as canções acompanham a lentidão das tristezas
ou os jubilos animados de uma selvagem festa
sinto minha pesada pele transformada em beatitude cheia de leveza
e agradeço, não mais a deus, que esse não se apresenta
mas ao mundo que conheço, e que é o da densa natureza
A peneira da carne sai filtrando isso tudo para atingir seu esplendor
e faz dos mais horríveis absurdos motivos para o pranto
Mas a meditação diz que devo aceitar passivamente o mundo sem nenhuma dor
E fazer de um rato pestelento a outra face de um santo
Mas além da beleza, também as agruras me despreparam o meditar
A feiúra dos acordes dissonantes da vida me arrepiam
E se vejo, dentro do reto, um torto, quero logo endireitar
Mesmo se forem as vozes dos pássaros que o canto incorreto piam
E se a força da mão que finca nas carnes a faca
é a mesma que tira das teclas o som do piano,
Se o grito que armas injustas enchem de inocentes a maca
e a música que nos tira as lágrimas ouvem-se do mesmo ouvido humano
Se a letra carnificenta que um tratado de guerra encapa
tem a mesama tinta de uma partitura desenhada num pano
Então estou convencido que o "tudo", do mesmo, não faz parte
a ilusão da matéria se tornou a única a encontrar meus sentidos
fazendo-me achar que o assassino é diferente dos que fazem arte
e a intenção não pode ser comparada aos resultados obtidos
E se pretendo me desapegar dessa matéria
desincorporá-la da vida para assoprá-la em prana
e fazer bolhas de sabão com toda essa coisa séria
iluminar do maior lume a vida que está fora dessa cabana
então não consigo mais ir em frente
tranco o pé firme nessa terra dura
e queimo vivo se a densa matéria é quente
e me agarro às sombras se a luz só se encontra na altura
Mas, desse canto, não foi posto, até agora, a maior da minha sinceridade
pois não são as belas imagens, ou o medo do feio
as aventuras que traz a flor da minha idade
ou as tentações que está esse mundo cheio
e nem é para dessa terra ter o maior dos mares
saborear, dos reinos, os poderes dos césares
ou ter domínio sobre todos os lares
não é por isso que não consigo me entregar à meditação
Mas é porque se me imagino liberto do que me apresenta a matéria
Já fico com vontade de voltar correndo e abraçá-los com força
e se quero ficar nesse mundo mais um pouco...
... é por que aqui eu encontro vocês
e não iria nunca para dentro de uma caverna...
... simplesmente porque eu iria morrer de saudades.
e meus votos de silêncio não existem...
... porque preciso contar-lhes do quanto são importantes.
e não sou capaz da plenitude da auto-realização...
... porque a vontade que tenho é de abraçá-los bem forte, carregá-los comigo, e dormir em seus colos para sempre
e se penso em ficar sozinho, em solidão ou solitude...
.... lembro que se me pintam de índio, olham em meus olhos e seguram minha mão, meu coração entende tudo isso como um presente.
e não consigo só viver o momento de agora...
... porque vocês sempre aparecem como lembranças.
e a meditação me diz que a felicidade não depende dos outros...
... mas quando estão comigo eu fico todo feliz.
e enquanto na terra vocês estiverem, é na terra, que pretendo ficar.
e se não consigo meditar...
simplesmente é porque gosto demais de todos vocês.
Engrandeço-me
6 years ago
1 comment:
Ainda pensando sobre... Um tanto profundo o seu texto e ao meu ver com grandes verdades. Se um conselho ou um texto eu fosse dar para responder ao seu texto, creio que a única coisa que poderia caber seria:
Tu não procures - não é lícito saber - qual sorte a mim qual a ti
os deuses tenham dado, Leuconoe, e as cabalas babiloneses
não investigues. Quão melhor é viver aquilo que será,
sejam muitos os invernos que Júpiter te atribuiu,
ou seja o último este, que contra a rocha extenua
o Tirreno: sê sábia, filtra o vinho e encurta a esperança,
pois a vida é breve. Enquanto falamos, terá fugido
ávido o tempo: Colhe o instante, sem confiar no amanhã.
Ou na forma clássica:
"Carpe diem quam minimum credula postero."
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